A viagem até ao Porto não podia ser melhor. O Davide estava eufórico e foi diversão todo o caminho. Após a típica foto de grupo seguimos para os autocarros que nos levaram à partida. A curta viagem foi igualmente descontraída e hiper divertida. Um nervosismo miudinho pairava no ar e os risos eram espontâneos a qualquer comentário.
O grande momento aproximava-se. Sentia-me motivada e aquele mundo de cor que os atletas davam à partida, encheu-me de energia positiva. Cruzei-me com o João Campos, uma figura inconfundível e simpática, autor de " Porque a vida não é só corrida!".
O tiro de partida estava prestes a chegar porque
esta música iniciou. Simplesmente divinal! Arrepiante! Fechei os olhos e escutei. Depois... avancei, feliz pelo passeio de emoções que me aguardava.
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Rotunda da Boavista. Simulação de voo! |
Eu e o Davide seguimos a um ritmo confortável e sem euforias. Fizemos os primeiros 10 kms quase sem os sentir. A cada km o Davide perguntava a quem pertencia (cada km 1 pessoa). Alguma conversa, surpresas à mistura (escutar o meu nome de um 4º andar de um prédio, não é muito comum!) "
Obrigada, Olivia, pela grande surpresa e por teres acordado tão cedo só para me apoiares!! Adoro tu!!!" Este momento foi mágico e deu-me um alento inimaginável!
Fisicamente não me sentia mal, apenas um ligeiro incomodo num gémeo e na coxa esquerda. Ignorei e segui tranquila.
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Alegriaa! |
Ao km 15 outro momento extasiante: a separação dos atletas da Family Race e os da Maratona. É qualquer coisa de sublime. Seguiam os audazes!
A viagem prosseguiu sem grandes alertas, mas o gémeo ia refilando. Senti algum receio de uma dor mais forte. Senti medo de não conseguir... Tirei estas ideias da cabeça e segui com o Davide a dizer que me queria ver com um sorriso no lado de Gaia.
Com 21 kms feitos senti algumas tonturas e dores de cabeça, aliado ao incomodo do gémeo. Abrandei o ritmo para tentar recompor-me. Concentrei-me na postura e nos atletas que corriam ao nosso lado. O Davide motivava e ajudava na tarefa de ignorar as mazelas.
Km 25, hora de verter águas. Não dava para adiar. Aproveitei para tomar um gel, beber água e comer banana. Seguimos tranquilos até à Afurada. As dores de cabeça e tonturas tinham desaparecido mas as pernas estavam a ficar teimosas. Não as escutei. Segui de queixo levantado e sorriso no rosto.
Outra surpresa me aguardava ao km 28. O meu amigo
Marco estava no km que lhe tinha sido atribuído, de bicicleta e máquina em punho. As suas palavras foram mágicas: "
Vamos Elisabete! Agora é a cabeça que corre!" Potente!! As pernas ganharam logo outra vida. Grande Marco!!
Logo à frente encontrei o João Lima. Aproximei-me de forma a poder dar um "
hi five" e motivação.
Km 30 foi a altura de abrandar para abastecer e alongar o gémeo uns segundos. Este simples gesto foi determinante para os derradeiros kms até à meta.
Recomeçamos e depressa senti a dor a desaparecer. Apesar do cansaço próprio, senti-me com mais energia. Não segui pelo empedrado de Gaia. Aproveitei sempre os passeios para evitar danos.
Ao km 33 começo a sentir uma dor nas costas que me prendia o movimento da perna direita. Abrandei e o Davide ganhou-me um avanço de 10 metros. Precisava reencontrar o meu ritmo e ignorar a dor. Alinhei as costas e equilibrei a passada. Parar não estava nos meus planos.
Segui nesta luta até ao km 35. Aqui bebi isotónico, água e tomei um gel.
Próxima paragem: a meta... mas, se até então era eu que vinha a orientar as mazelitas da minha estrutura óssea, a partir dali foi o Davide quem começou a sentir algumas dificuldades nos tornozelos. Tivemos de abrandar. O tlm também tocou nessa altura a confirmar a presença dos nossos filhos na meta. Mais uma força a puxar pelo coração.
A partir do km 39 o meu corpo teve uma reação inesperada: pernas leves, respiração controlada, energia em alta e dores... que dores??? Não sabia o que eram dores nessa altura. Aliás, também não foram assim tantas que senti até ali! Só tinha vontade de acelerar, mas o Davide estava em dificuldade para me acompanhar.
Olho o mar a ser atingido pelos relâmpagos. O céu cinzento e pesado fazia prever uma enorme chuvada... e choveu!!
No km 40, já debaixo daquele dilúvio surge o Jaime, de guarda chuva. Pedi para acompanhar o Davide. Seguimos rumo à meta.
A euforia tomou conta de mim, e aqueles 2 últimos kms corri-os como se tivesse a iniciar a prova... acho que estava anestesiada ou em piloto automático. Não senti o peso de 40 kms nas pernas!
Km 42 vejo o meu filho. Ele correu até mim e dá-me a mão. Naquele momento ouço a voz do grande amigo, José Belmiro, que estava ali para dar o impulso final "
Força Elisabete, falta pouco!". Ter resistentes assim na linha da meta não é para todos!
Olhei para o meu filho e o coração disparou de alegria. Imensa alegria! As lágrimas misturaram-se com a chuva. As pernas voavam, indolores. O meu filho dizia "
Força mãe, tu consegues!!! Mãe, tu conseguiste!!!
Terminei os 42,195 km num momento
Épico, único e inesquecível com a minha vida... o meu Rafael! Ainda não encontrei uma foto a provar este momento, mas o registo ficará gravado no meu coração, para sempre.
O Davide também teve o privilégio de cortar a meta com o filho, graças à esposa (Elisabete Gonçalves) que aguentou com os miúdos (o meu filho e o dele) debaixo da chuva diluviana. Eles sim, foram uns verdadeiros heróis.
Assim que terminei senti uma má disposição e seguiu-se uma sessão de tentativa de vómito. Talvez uma acidose metabólica, o certo é que depressa passou.
Senti a adrenalina ao máximo nível. Sem sombra de dúvida uma viagem emocionante e uma enorme vitória pessoal. Uma satisfação indescritível, que, por muito que tente escrever, nunca conseguirei transmitir em palavras o que se sente nestes momentos.
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Merecida!! |
Agradecimentos:
Após ter tomado a decisão de fazer a maratona, recebi muitas mensagens de força e de motivação por parte de amigos e conhecidos que, tal como eu, são loucos pela corrida. Também houve quem não acreditasse que eu seria capaz e duvidavam mesmo que eu cortasse a meta. Mas isso tornou-me mais forte. Canalizei toda a minha atenção na preparação e nas pessoas que acreditaram em mim.
- Assim, quero agradecer aos meus seguidores deste blog um imenso obrigado pelo apoio que me deram em todas as etapas. (Ana Pereira, João Lima, Carlos Cardoso, Filipe Torres, o meu conterrâneo, Joaquim Costa, Silvio Horta... e todos os que lêem mas não comentam)
- Um agradecimento especial a todos os que me acompanharam durante 42 km, no pulso direito. Cada um com uma característica e motivação próprias. Mesmo os que não puderam estar presentes, estiveram em pensamento e no coração.
- Obrigada Marco Magalhães, por estares no teu km a injetar-me energia!
- Obrigada Olivia, pela amiga que foste e que és!
- Obrigada Belmiro, pelo alento especial na descida para a ribeira e na reta da meta!
- Obrigada Jaime, por estar à nossa espera debaixo de forte chuva, para nos levar à meta!
- Obrigada Elisabete Pinheiro, por estares com meu filho no final e... por tudo!
- Obrigada Sr António e D. Engrácia, por esperarem por nós debaixo do dilúvio.
- Obrigada a todos os atletas que se cruzaram por mim e deram um grito de incentivo.
- Obrigada aqueles amigos que me ligaram e enviaram mensagem a saber se tudo tinha corrido bem!
Finalmente vai um enorme agradecimento ao grande amigo, Davide Pinheiro, que sempre me apoiou e participou em grande parte da preparação. Fazer a prova em sua companhia foi decisivo para o seu sucesso. Equilíbrio e moderação foram as palavras de ordem! Mil vezes obrigada!
Agora sou... Maratonista!
Um obrigada a todos os que conseguiram ler o post até aqui e terminaram a leitura com um sorriso!
Grande Maratona!